"Eu te busco de todo o coração; não permitas que eu me desvie dos teus mandamentos." (Salmo 119:10)

sexta-feira, 19 de julho de 2013

O lugar para ser criança

Aquela loirinha esperta não era boba nem nada! Ela sabia muito bem que ali ninguém poderia detê-la. Estava decidida a salvar todos do poderio sombrio da megera daquele país. Diziam as más línguas que a rainha daquele reino tinha algum problema com aquelas pobres crianças, dizia que estavam sempre sujas, que cheiravam a pó, que não podia ficar perto nem podiam ser tocadas por ninguém porque o leve toque numa criança pobre daquele jeito resultava em grande alergia! A loirinha decidiu que não agüentava mais! Ela sabia que precisava arranjar um lugar onde todas pudessem ser abrigadas. E ela sabia exatamente onde era este lugar. 

A loirinha, com seus cabelos crespos   cachinhos que enrolavam tanto que a gente nunca sabia qual era o comprimento de verdade - era zangada, era inteligente, fazia muitas perguntas e afirmava muita coisa também. Ela tinha um lugar só dela, um espaço que ninguém podia ultrapassar, tinha uma barreira invisível ali. Neste espaço ela se protegia de tubarões, se escondia dos monstros mais horrorosos que pudessem existir. Neste espaço ela podia colocar as pessoas doentes, podia ajudar crianças, dormir, comer e ler em paz. Era o lugar perfeito. E o melhor de tudo: a rainha não tinha poder ali. Nenhum. A grande deusa tinha presenteado a loirinha com aquele lugar encantando. Estava decretado pela deusa, que era muito mais poderosa que a rainha, que aquilo era propriedade da loirinha! Que ela podia fazer o que quisesse e ficar ali pelo tempo que lhe fosse conveniente. Foi o melhor presente já dado por uma deusa ao uma pequena mortal.

Vários outros protegidos da grande deusa já tinham sido presenteados com os mais diversos utensílios: transportes incríveis, roupas mágicas, livros de encantamentos, cadernos de feitiços... Alguns poucos tinham ganhado lugares especiais também, assim parecidos com o da loirinha, mas nenhum tinha tomado tamanha proporção de importância como o lugar da loirinha. Aquela loirinha era inteligente. Muitos não tinham dado tanta atenção àquele espaço sem graça, mas ela enxergava além! Ela enxergava muito além, porque ela sabia para que usar aquele lugar lindo. Está bem... Não era tão lindo assim, mas ia ser de muita serventia!
A loirinha não perdeu tempo em transportar pouco a pouco todas as pobres crianças do reino para seu pequeno recanto. Primeiro explicou a elas que o lugar não era lá essas coisas, era bonitinho, limpinho, mas não era muito grande, no entanto, dava pra todo mundo viver em paz fazendo o que quisesse desde que não houvesse desentendimentos. As pobres criancinhas adoraram a idéia! Afinal, para elas não importava como era o lugar, estavam felizes por terem um lugar! Estavam felizes por terem um lugar onde pudessem se esconder, onde pudessem brincar! Brincar, brincar, brincar, brincar, brincar o dia todo!

Lá estavam a salvo de sacis, de rainha, de vermes, de tudo o que podia atrapalhar a alegria de uma criança! Às vezes uns pouquinhos ousavam adentrar e bagunçar a paz daquele lugar, mas com coragem e ousadia a loirinha saberia resolver a situação. Um simples “sai!” resolvia tudo! Aquele lugar era a verdadeira expressão do que era ser criança! Ali podiam ser tudo! Ali podiam fazer o que quisessem, ali ninguém brigaria se a loirinha pegasse todas as suas bonecas, pobres crianças daquele reino, e as colocasse sentadas, jogadas... Ali a mamãe, a rainha daquela casa, ficava mais tranqüila, afinal, era tudo brincadeira, ela estava concentrada e quieta em seu lugar, e outra coisa, a vovó Deinha, a grande deusa, foi quem deu aquele lugar de presente e ela não podia fazer nada para retirá-la dali já que esta era a fonte dos sorrisos da loirinha. Ali naquele lugar, ali naquela rede, a loirinha podia se embalar o dia todo, se sentir uma princesa, se sentir uma adulta, balançar suas bonecas, ler, dormir, ouvir Toquinho e descansar tranquilamente... Ali, naquela rede, não havia nada de errado.

Quem ligava pra uma rede? Qual era o problema de se ter uma rede? E não havia crescido sempre com uma rede do lado mesmo? Agora que não viessem reclamar se a loirinha, com toda a sua criancice e autoridade, tomava partido por seu lugar, que não viessem reclamar se foi numa rede que a acostumaram a ser embalada antes de dormir, que não reclamassem se ela virou a menina da rede, a indiazinha, a loirinha da rede. A dona do lugar encantado.

Steffi de Castro

Para Esterzinha, minha priminha, hoje com 4 anos. Na época deste texto ela tinha 3 aninhos e havia ganhado uma rede de presente da avó, o lugar perfeito para ser criança: uma rede, que ela ficava o dia inteiro e não podiam desarmar de jeito nenhum.

Por que crescem?





Um comentário:

GAbi disse...

Que talento! Adorei o texto! Beijos
Tia Gabi