"Eu te busco de todo o coração; não permitas que eu me desvie dos teus mandamentos." (Salmo 119:10)

quinta-feira, 6 de outubro de 2016

Como faço para me enxergar melhor?

Mônica Crema


Eu não acho que sou uma pessoa muito difícil de conviver, porém, tenho um defeito muito sério: tenho muitas dificuldades de enxergar meus próprios defeitos. Talvez porque, sinceramente, eu nunca faço alguma coisa pensando em, propositalmente, causar mal a alguém, entretanto, tenho certeza que acabo causando mal a algumas pessoas, inevitavelmente. Sinceramente, também não sei por que este texto está começando desta maneira, eu queria mesmo era falar de como ontem eu me dei conta de que sou uma pessoa dispensável. De alguma maneira, todos somos dispensáveis em alguma medida: ou somos dispensáveis para algumas ocasiões, ou para algumas tarefas, ou para algumas pessoas mesmo, em termos de afeto e cia. Enfim, eu me dei conta de que sou uma pessoa dispensável e isso me atingiu de maneira que eu não pensei que seria atingida.


A primeira coisa que me ocorreu foi de que eu estou muito carente e sou muito sensível. Eu escuto isso de tanta gente que estou me acostumando a entender isso como as minhas justificativas para tudo, inclusive, são as que estou mais utilizando no momento. Não por conveniência ou preguiça de refletir mais sobre o que vem acontecendo comigo, realmente acho que existe sim um pouco disso tudo. Só que tem outra coisa que tem acontecendo comigo e eu tenho percebido. Eu realmente tenho percebido isso, pois é notável no meu pensar, no meu falar e no meu agir: eu não me conheço. Ou melhor: eu estou me conhecendo melhor somente agora. E todos os dias quando acordo eu tenho que orar para não cometer mais um deslize, eu tenho que torcer para que eu não faça nenhuma merda ou diga alguma besteira muito grande.

Há algum tempo, há alguns textos, eu certamente escrevia como a pessoa durona por fora, mas bem incapaz por dentro. Acredito que essa face de durona por fora está cada dia mais despedaçada do que os pedaços que eu tenho por dentro. Eu sou sensível mesmo, não estou reafirmando isso aqui como um grito de guerra, pelo contrário, estou reconhecendo que sou o tipo de pessoa que se magoa muito facilmente e me sinto bem fraca quando falo isso. Eu me sinto fraca e bem idiota, para falar a verdade, porque soa como se a qualquer momento eu desesperadamente pedirei pra alguém me dar atenção. Evito fazer esse tipo de coisa, mesmo que seja a minha vontade às vezes.

Eu sou carente também, eu também tenho percebido isso com mais força. Hoje de manhã outro estalo veio à minha cabeça: eu sou completamente incompleta, inconstante e não preparada para, por exemplo, dividir minha vida com alguém. Acreditem em mim quando eu digo que isso realmente me deu um desespero no momento, mas assumir isso pra mim mesma também, de alguma maneira, foi libertador.

Eu faço questão das pessoas sim. Eu continuo acreditando, e esse é o lado racional bem forte em mim, que não temos que exigir que o outro nos ame, que a cada dia mais o exercício que devemos fazer é o de nos libertar do ego. Vez ou outra eu me pego pensando de que como eu gostaria que pessoa x ou pessoa y se importassem comigo como eu me importo com elas, ou melhor, demonstrassem pra mim como eu demonstro (pelo menos acho que demonstro, pode ser que eu nem faça isso direito) para elas, mas aí fico me martirizando, porque eu acho isso muito egoísmo da minha parte: exigir carinho do outro, pedir carinho do outro.

Eu não sei se conseguirei explicar direito, mas é que eu acho que devemos demonstrar sempre (e eu venho aprendendo a fazer isso), mas não exigir que as pessoas façam isso por você como consequência do que você faz por elas, não pensar que o outro tem a obrigação de fazer isso. Bom senso não é obrigação. Eu acredito que o que te faz forte é a prática diária de fazer sem esperar nada em troca. Então, quando eu me pego pensando em como eu gostaria de me sentir querida, sinto-me muito muito fraca. Mas também tenho pensado muito no que outro dia disse uma colega minha: amar é diferente de gostar. Como cristãos, pelo menos, temos o amor como o dever, algo que devemos fazer. Sim. Fazer. Amor também é prático: você demonstra, você faz pelo outro, você diz. O gostar não... (não confundam com paixão). Temos que amar as pessoas, mas isso não significa que gostamos sempre delas, ou que sequer gostamos delas alguma vez. É que gostar parece uma palavra tão obsoleta, não é mesmo?

Bem, eu já perdi minha linha de raciocínio até aqui, mas estou pensando, muito mesmo, que está na hora de começar a definir por quem, e até quando, vale a pena passar por alguns perrengues sentimentais, levando em consideração tudo isso que aprendi sobre mim mesma esses tempos. Não existem fórmulas, nós sabemos disso (ou pelos menos é pra gente saber). Cada relacionamento é um relacionamento, seja amizade, namoro, casamento ou família. É preciso então um parâmetro, algo que possa te ajudar a, a partir daí, definir o que é melhor manter ou não. Eu fiquei pensando no que poderia ser isso e só me veio à cabeça o amor fraternal. Quando existe esse tipo de amor na relação, que envolve não só o amor-prática que devemos ter para com todos os humanos, mas principalmente o gostar de verdade do outro, é que a gente consegue segurar a corda mesmo que o outro esteja puxando com muita força ou nem esteja segurando. Por algumas relações vale a pena machucar as mãos, derramar umas lágrimas - por outras não. Não porque essas pessoas são ruins, mas talvez porque elas se encontram melhor em outras relações - e nós também.

Assumo minha sensibilidade, assumo minha carência, assumo minha necessidade de ter por perto as pessoas que amo - não sou um grude, eu juro! mas gosto de compartilhar minha vida e ouvir sobre a vida do outro, além de fazer parte também - e admito que, para o meu bem e para a libertação das pessoas de não terem que corresponder às minhas expectativas emocionais, eu definirei até que ponto eu suporto que o outro não me suporte (no sentido de ser suporte, apoio, do outro), até que ponto eu suporto o fato de que eu tenha que lembrar da minha existência, até que ponto eu tenha sempre que deixar minha história em segundo plano. Vale pra mim também: até que ponto eu consigo ser suporte para alguém? Até que ponto eu estou sendo satisfatória para as pessoas? Até que ponto eu consigo ser presente na vida dessa pessoa? Qual a minha responsabilidade e quais as consequências disso tudo? Como faço para me enxergar melhor? Como faço para segurar melhor, com mais carinho, o que tenho nas minhas mãos...?

Não sei se estas características que assumi que possuo aqui são de fato defeitos, mas algumas vezes elas tem me atrapalhado, acabam sempre me ajudando somente a me colocar em posição de vítima. Pronto, outro defeito: eu sempre tendo a me vitimizar. E, definitivamente, eu não sou uma vítima toda vez. Mas, é um começo, não é? É um começo para essa caminhada de olhar mais para dentro, limpar mais o jardim, e deixar um ambiente mais livre e aconchegante para quem quer que se achegue.


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